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BRASIL: DO CAOS AO CAOS - PARTES 21, 22, 23, 24
BRASIL: DO CAOS AO CAOS - PARTES 21, 22, 23, 24

NOTA AO LEITOR: PARA SUA TOTAL COMODIDADE, ESTE LIVRO PODE SER LIDO NA ÍNTEGRA POR VOZ NEURAL SINTÉTICA, BASTA VOCÊ CLICAR NO BOTÃO LOCALIZADO AO FINAL DESTA PÁGINA!

 

Vigésima Primeira Parte
O Primeiro Grande Massacre de Policiais

Dezenas de viaturas e um número exorbitante de policiais chegou ao local. A tropa de choque avançou à frente, marchando e batendo em seus escudos, como sobreaviso de que o coro ia comer. Na retaguarda, um exército de policiais avançava aguardando o momento do confronto. Mas o povo não arredava pé, decido e obstinado pelo confronto. Pelas redes sociais, toda sorte de pessoas de todas as classes sociais se organizavam para se unir ao movimento.


As torcidas organizadas se uniram e foram às ruas promovendo um quebra-quebra generalizado. Dezenas de ônibus chegavam lotadaços de vândalos sedentos de sangue. Cacetetes, rojões, bombas de São João, galões de gasolina aos montes, tacos de sinuca, tacos de baseball, espingardas de chumbinho, pedras às toneladas, facas, facões, cabos de aço, soco inglês, espada ninja, revólver, garrucha, armas de brinquedo (valem pelo terror psicológico!), etc.


Era estonteante, uma infinidade de "instrumentos" para incrementar a revolta popular, pois aquele parecia um momento propício para a anarquia geral. No ínterim, bandos de traficantes e toda sorte de bandidos bem armados imiscuíam-se no meio do povo, se aproveitando da situação para alimentar a discórdia. Era um momento perfeito para toda sorte de oportunistas e cafajestes.


Logo a polícia se viu cercada por todos os lados. Não parecia haver saída. Tiros para intimidar não estavam fazendo o efeito desejado, nem tiros de balas de borracha, nem mesmo tiros letais. Gás lacrimogêneo não assustava e nem dispersava o avanço das turbas ensandecidas. Garrafas com pavios acesos cruzavam os céus e explodiam em cima das viaturas que logo estavam em chamas.


A tropa de choque de repente se viu desorientada e perdida diante de uma maré humana endemoninhada, desprovida de qualquer noção de perigo. O pau comeu, e embora de início a polícia levasse ligeira vantagem, logo retrocedeu, claramente sucumbindo. Foi um massacre sem precedentes, um choque inesperado que desmoralizou o orgulho da polícia e derrubou por terra toda sua moral. Os que tombavam sem vida estavam livres da humilhação e da dor, mas os que ainda estrebuchavam eram logo executados. E para os que por alguma razão ainda insistiam em pedir misericórdia, as pedradas, chutes e facãozadas logo mostravam os caminhos do céu – ou do inferno.


Da sede do governo paulista, o Governador deu ordens para que o comandante da Polícia Militar evitasse excessos (ou ao menos amenizasse os excessos), enquanto de sua janela, o atônito Governador contemplava milhares de protestantes que se aglomeravam na frente do Palácio dos Bandeirantes. E aos milhares de manifestantes, juntavam-se cada vez mais gente, de diversos movimentos.


E a imprensa estava em peso em todos os lugares. Nunca se vira tantos repórteres, fotógrafos, câmeras, celulares e helicópteros de televisão. O que fazer? Muitas placas com diferentes reivindicações mostravam que o povo revoltado estava confuso e dividido, sem um objetivo comum. Muitos exigiam o “fim do descaso”, “O FIM DA VIOLÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR”, a “EXTINÇÃO DA POLÍCIA MILITAR!”, a “renúncia do Governador”, “moradias para os sem teto”, “o fim das cracolândias”, etc. Tinha até um cartaz solitário que pedia a “liberação da maconha” e um que pedia a “expulsão de todos os nordestinos” de São Paulo. Outro pedia urgentemente a volta do regime militar. Ainda não havia ordem e nem consenso, pois a revolta acontecera de modo tão inesperado e sem preparação, que não se sabia o por que de tudo aquilo. Mas no momento que alguns desordeiros mais exaltados começaram a lançar coquetéis molotov contra o Palácio dos Bandeirantes, aí a desordem teve início, já que a multidão só precisava do pontapé inicial para começar a bagunça.


Não teve barreira policial que segurasse o avanço rumo ao interior do palácio. Imediatamente o Governador foi retirado às pressas para um local seguro, enquanto seu centro de comando era invadido pela população. Era tanta gente se apinhando dentro do palácio que mais parecia um formigueiro humano. Mal se conseguia respirar. Do lado de fora era uma algazarra geral, com gente até onde a vista podia alcançar. Milhares de homens e mulheres a gritar como uma só voz, enquanto uma chuva de papéis era lançada a partir das janelas do Palácio do Governo. Tudo estava sendo destruído sem a menor noção de consequências. O povo unido é uma força poderosa. Mas sem liderança e organização, até mesmo um exército forte torna-se como ovelhas desgarradas e à mercê de lobos. É necessário um pastor para guiá-las e protegê-las.


Enquanto isso na Zona Leste, cerca de cem homens da Polícia Militar viam o caos se aproximar de ambos os lados. Era um dilema para o comandante. Ou ele liberava o uso letal de suas armas ou seus homens virariam picadinhos. Ele então pensou, pensou e pensou, e depois repensou tudo que havia pensado.


A razão acabou por falar mais alto. Ele mandou que o governador fosse pentear macacos e liberou aos seus homens o uso letal de suas armas a fim de proteger suas vidas e manter a ordem. Nada deu maior prazer aos policiais apavorados, que no momento seguinte mandaram bala na direção dos revoltosos.


Várias dezenas de pessoas pegas de surpresa caíram com os rostos por terra. Aquilo só deixou o povo ainda mais enlouquecido. E os gritos só aumentavam a adrenalina geral. – Assassinos! Assassinos! Assassinos! E quanto mais gritavam, mais se aproximavam da polícia, que revidava com uma chuva de tiros sem medir consequências. Era gente caindo pra todo lado. Mas o cerco foi fatal, afinal os números estavam a favor do povo. A calamidade era inevitável: os policiais, espremidos por todos os lados, não tiveram a menor chance.


Era paulada pra todo lado, tudo sendo assistido ao vivo e em cores graças às imagens em alta definição transmitidas pelos inúmeros helicópteros de emissoras de televisão. O mundo parou para assistir o caos no Brasil, onde a revolta se espalhou como uma doença contagiosa. De um momento para outro, todos os os estados da federação estavam em polvorosa. O povo correu para as ruas a fim de dar ao sistema, de uma vez por todas, a "ordem e progresso" que ele tanto merecia. Foi assim que a desordem e o retrocesso deram início ao que viria a ser de fato a ordem e o progresso, criados a partir do caos absoluto. Com o decorrer dos dias e das semanas, toda aquela bagunça generalizada e confusa foi ganhando um aspecto organizado de movimento revolucionário de caráter separatista. Nas redes sociais se propagavam ideias irracionais em meio a ideais confusos, muitos dos quais baseados nos conceitos hitleristas de superioridade racial, em sua maior parte organizados e difundidos a partir da região sul.

 

Vigésima Segunda Parte
A Confederação do Equador

Na região Nordeste, renascia o ideal separatista com base lá no século dezenove, com a Revolução denominada Confederação do Equador. E havia também a mágoa pela decadente colonização portuguesa, já que em Pernambuco muitos ainda se imaginam como seria aquele estado se os holandeses não houvessem sido expulsos. Enfim, coisas sem sentido, mas que no fundo fazem todo sentido do mundo.


Novamente o centro do movimento era Pernambuco, onde enormes multidões foram às ruas e se confrontaram com a polícia, num intenso e horripilante derramamento de sangue. Logo as coisas estavam completamente fora de controle. Seguindo os passos dos pernambucanos, os outros estados fizeram a mesma coisa. De um momento para outro, simplesmente não havia mais uma ordem governamental estabelecida, pois o povo assumira o controle total de todos os estados.


Nos dias seguintes, os confrontos se intensificaram. A anarquia era geral e as forças de segurança pública já não tinham mais condições de por ordem nas coisas. O governo federal decretou Lei Marcial e mandou o exército às ruas. Muitos confrontos ocorreram entre revolucionários e forças federais, ocasionando enormes baixas de ambos os lados. Só então as Forças Armadas começaram a ter uma real dimensão da tragédia que se desenrolava. E mesmo com todo seu poder, não estavam conseguindo restabelecer a ordem perdida, não sem um emergencial e necessário banho de sangue.


Os confrontos se tornaram mais ferozes, porém aquilo estava se mostrando um desastre que ao invés de ir de encontro à ordem, só estava servindo para afundar mais e mais o país numa ensandecida carnificina. Não era fácil admitir, mas o país mais pacífico do mundo estava envolvido de fato numa guerra civil, gerando uma desordem sem precedentes no país do futebol. Os dias se passaram, as semanas correram, os meses se foram, ao passo que a luta intensa deu aos revolucionários disciplina e objetivos concretos. Os combates agora aconteciam de maneira eficiente e competente. Com o tempo, mais e mais militares começaram a bandear pro lado dos revoltosos, que já contava com um número enorme de soldados simpatizantes do movimento. Trazendo novas experiências e novas táticas, os mesmos faziam a diferença. Com a conquista de várias bases da Força Aérea, os revolucionários tiveram acesso a recursos militares até então exclusivos das Forças Armadas. E a coisa só se complicava mais e mais.


Lá pras tantas do antagonismo nacional, o conflito dantesco começou a configurar uma nova face, com claras e evidentes intenções de limpeza racial, étnica, social e religiosa em alguns lugares. No sudeste, grupos intolerantes perseguiam minorias e executavam sem piedade. Logo as vítimas passaram a ser nordestinos e até mesmo estrangeiros de origem latina. Corpos apareciam aos montes jogados em lixões e valas. O rio Tietê passou a ser um depósito repugnante de cadáveres. Os acusados dos crimes eram perseguidos implacavelmente pelos corpos policiais organizados pelas lideranças revolucionárias. Quando tinham sorte, eram enviados a campos de trabalhos forçados.


Quando não, eram executados imediatamente, sem dó ou piedade. Tornara-se fácil livrar-se de um rival qualquer, bastando que o mesmo fosse acusado de intolerância. Quando se tratava de neonazistas, quase sempre não escapavam de uma rajada de balas. No sul, a intolerância mostrava sua face mais sombria. Ali os grupos neonazistas se multiplicavam, atacando geral, não poupando ninguém que não tivesse “um mínimo de características arianas”. Igrejas e templos eram incendiados e religiosos eram queimados em estacas nas madrugadas, sob o estandarte de Adolf Hitler.


Uma nova perseguição genocida teve início contra os judeus e certas religiões. As forças revolucionárias do sul iniciaram uma corrida ensandecida pelos grupos neonazistas. Filas intermináveis de racistas acorrentados eram organizadas, em seguida as mesmas eram conduzidas a câmaras de gás, onde os monstros hitleristas eram exterminados e em seguida incinerados. Os céus dos pampas ficaram negros pela fumaça dos crematórios. As cinzas se espalhavam pelos ares, tornando a vida muito mais difícil, pois o ar estava infestado pelo cheiro de carne queimada de neonazistas. O pó das cinzas cadavéricas pousava sobre as roupas nos varais e até passou a ser usada como complemento alimentar para animais. E vendida a um preço modesto, as cinzas dos mortos neonazistas passaram a ser uma fonte de lucro que alimentava a máquina de guerra dos revolucionários sulistas.


No Nordeste, ao contrário do que ocorria no sul e no sudeste, com suas múltiplas preocupações, os revoltosos estavam centrados no ritmo da revolução e na luta para obter resultados positivos a curto prazo. Em contrapartida, de olho no que ocorria no sudeste e no sul, onde muitos nordestinos estavam sendo perseguidos e mortos, os combatentes aliados vindos do nordeste eram uma força eficiente e destemida que fazia a diferença. Com ordens de proteger os conterrâneos radicados no sudeste e no sul, os revolucionários nordestinos não mediam esforços. E assim, o irracional sangue dos intolerantes tingia de vermelho os campos e as paredes das cidades.


Era mais prazeroso alimentar e dar água a um cão faminto do que dar água ou ração a um intolerante racista moribundo a clamar por uma mísera gota do líquido vital. E assim os corpos se amontoavam para incineração. Quando faltava energia, não raro as noites eram iluminadas pelos amontoados de cadáveres em chamas.


Pouco a pouco a irracionalidade foi tomando ares de consensualidade no que dizia respeito aos rumos do conflito e seu final, pois os poderes centrais já não se sustentavam mais, e vários segmentos das forças armadas claramente tomavam simpatia pelo movimento. Além do mais, todos estavam cansados daquela loucura, que em apenas pouco mais de um ano já registrava um número exorbitante de vítimas. Vinham à tona os massacres estonteantes executados em nome da justiça e da “Nova Ordem”.


Ao fim de tudo, pairava no ar a pergunta inquietante e persistente: valeu realmente o resultado da guerra em detrimento de tamanho sacrifício humano?


Vigésima Terceira Parte
Entre as moscas e as moças

Naqueles tempos se tornou muito difícil confiar nas pessoas. Moças bonitas eram usadas como armadilhas para pegar soldados ou revoltosos trouxas. Afinal, poucos são os homens que não se rendem a um belo par de coxas, em especial após um longo tempo de abstinência sexual forçada por conta de situações adversas.


Reinava uma desconfiança geral contra as moças, consideradas senão prostitutas, espiãs. Onde se via uma moça de “espreita” ou de “zoião”, logo se desconfiava de espiã. Por conta disso, muita jovem sortuda era trancafiada, enquanto as mais azaradas logo se viam entre a cruz e a espada, vitimadas por uma verdadeira caçada às bruxas. Por outro lado, nunca as moscas foram tão odiadas. Sua proliferação era praticamente uma maldição, pois as condições eram muito propícias graças à abundância de corpos jogados às valetas putrefatas e fétidas onde ficavam apodrecendo a olhos nus, numa indiferença nunca antes imaginada. Ratos e urubus não davam mais conta de sua natural tarefa de limpeza.


O cardápio já estava repetido demais. E como era de se esperar, as doenças se espalharam acometendo as populações mais expostas à precariedade da higiene daqueles tempos conturbados. Se por um lado desconfiava-se que jovens bonitas cheiravam a armadilha, por outro lado os enxames atormentadores de moscas eram sinal de cadáveres na área. Nesse ponto, as muriçocas eram quase uma bênção à parte, pois cada picada sentida era sinal de que suas vítimas ainda estavam vivas. Surgiu então um provérbio que ironizava: “entre as moscas e as moças, eu prefiro as muriçocas”.


O número de jovens prostitutas era elevadíssimo. Não raro, até quem tinha o privilégio de manter-se acima de qualquer suspeita, muitas vezes exercia o ofício secretamente. Para quem fazia o sacrifício por necessidade, valia o ditado que diz: “em prol da vida tudo é válido”. Ainda assim, o número de estupros era assombroso, e só teve uma redução significativa quando as lideranças revolucionárias anunciaram a castração sumária de todos os acusados desse crime hediondo e passaram a empreender uma perseguição implacável aos facínoras. Muitos foram executados sem piedade, mesmo após serem castrados em público.


E assim, as mulheres, que davam uma tremenda contribuição à guerra – das camas dos prostíbulos aos campos de batalha –, tiveram um pouco de sossego e se sentiram mais respeitadas e protegidas, e até certo ponto, menos violadas em seus diretos mais humanos, principalmente os de escolha.


Não há o que conjecturar: na guerra o grande e inevitável mal são as grandes somas de vidas perdidas. Nisso consiste o altíssimo e traumático preço a ser pago. O que é destruído, pode ser reconstruído. Mas a vida é uma dádiva de Deus. O gigantesco saldo de vítimas só reforçava a urgência em cortar as asas da corruptolândia a qualquer preço. Assim, no pós-guerra, a corrupção viria a ser transformada em crime hediondo. Novos conceitos renasciam do pó.
Novas esperanças brotavam das cinzas da guerra civil. Não demorou muito, as tropas populares começaram a se aproximar do centro do poder, Brasília. Menos de doze meses depois do início do conflito, a URNON por fim cedeu a um pedido de trégua do exército, que pedia o fim do derramamento de sangue entre irmãos. Após sentarem-se à mesa a fim de negociar os termos, as seis partes chegaram a um consenso, finalizando a guerra civil.


Vigésima Quarta Parte
O fim dos desmandos – um novo começo

 

E assim, Brasília caíu nas mãos do povo. O Congresso e o Senado foram dissolvidos. Senadores e deputados sortudos bem conhecidos da mídia foram considerados hostis e enviados pra prisão, enquanto a maioria não teve a mesma sorte e caíu irremediavelmente nas mãos do povo, que os transformou em picadinhos.


O então Presidente da República foi "convidado" a renunciar, o que ele fez com todo prazer, haja vista o desejo do povo de fazer dele e de sua família churrasco em praça pública. Em seguida o mesmo foi gentilmente conduzido com seus familiares até um presídio, preparado exclusivamente para eles, com todo requinte necessário e obviamente a segurança que um ex-Presidente merece.


Por fim as lideranças revolucionárias e as Forças Armadas se reuniram para as decisões finais sobre os acordos firmados entre as partes. E assim, o mapa do Brasil sofreu uma nova configuração, com a separação e autonomia política das regiões Nordeste e Sul. No Sul nasceu a república da União Federativa dos Pampas, com sede em Florianópolis.


No Nordeste nascia a União dos Estados Confederados do Nordeste, com sede em Recife. Não houve multas nem indenizações de guerra, somente um saldo monstruoso e avassalador de aproximadamente 400 mil mortos, entre revolucionários e militares. Mas como sempre, a população civil foi quem de fato sofreu, e o saldo de vítimas nunca vai ser realmente conhecido. Embora as estatísticas indiquem um total aproximado de 20 mil vítimas inocentes da insanidade, sendo que pelo menos 10 mil foram crianças, das quais aproximadamente 5 mil só na região Nordeste. O restante das vítimas foram mulheres e idosos.


Abusos de poder, violação de direitos humanos, estupros em escala colossal, algo nunca imaginado nem nos piores pesadelos. Não havia dúvidas de que aquela guerra tinha sido de fato uma grande festança para o diabo e suas hostes demoníacas. Uma tragédia de dimensões tão eloquentes que dificilmente seria superada em apenas uma geração. Mas enfim, estava para nascer uma nova era, forjada no sangue e na determinação de heróis e anti-heróis, representantes de um povo cansado de ser pisado e humilhado, explorado e enganado por aqueles que tinham o dever e a obrigação de cuidar e proteger os seus.


Na União dos Estados Confederados do Nordeste as obras de reconstrução trouxeram novas e grandes possibilidades. O entusiasmo era geral e o trabalho incessante, ao mesmo tempo em que milhares e milhares de nordestinos começavam a voltar de outras regiões a fim de reconstruir sua terra e formar uma nova nação. Grandes multinacionais, empolgadas com as grandes obras que surgiam, se instalavam no novo país. Enormes investimentos faziam de todos os estados da região em construção um infinito canteiro de obras.


A mesma coisa ocorria nas outras regiões separadas, embora claramente os grandes investidores preferissem as regiões Nordeste e Sul. No ínterim, grandes empresas fecharam as portas no Sudeste e mudaram-se para a União dos Estados Confederados do Nordeste, enquanto outras migraram para a União Federativa dos Pampas, em busca de novas possibilidades, pois o Sudeste, em especial São Paulo, estava um caos.


Cidades haviam sido desoladas pela guerra. Populações inteiras haviam sido exterminadas. Mas ainda assim, a força e o orgulho dos paulistas não se permitia sucumbir. No Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa era a própria visão do apocalipse.


As populações das favelas ocuparam as áreas nobres da Capital, expulsando ricos e poderosos para os morros, onde muitos eram massacrados pelos traficantes que continuavam a dominar, agora mais fortes que nunca, graças à desordem criada pela guerra civil (porém, mal sabiam eles que após o fim da guerra, uma nova guerra seria desencadeada: uma guerra contra o tráfico, que exterminaria 90% dos traficantes do Rio e de todo o país, e os sobreviventes seriam enviados para os super presídios de segurança máxima na selva amazônica, de onde nunca mais sairiam).

Nascia uma nova classe social, na qual os favelados, de posse de bens e possessões alheios passaram a ocupar o topo da pirâmide. Era a própria visão do inferno, hordas de moradores de rua e pessoas de comunidades devorando comida de rico e enojadas com o tal caviar.

"Se num fôssi a Revolução, eu nunca que ia prová essa iguaria. Muito menos sabê que era uma coisa tão nojenta. Cruz credo! Qui nôjo!" comentou certa senhora com cara de miserável e morta de fome.

Ao mesmo tempo, por todos os lugares, os anteriores e intocáveis ricos das áreas nobres, sem poder escapar da cidade – pois todas as portas de saída (rodoviárias, aeroportos, portos, estradas, atalhos...) estavam fechadas ou bloqueadas –, empreendiam uma fuga alucinada pela vida, enquanto as hordas insaciáveis de sangue “nobre” faziam uma verdadeira caçada aos pobres miseráveis, que criariam verdadeiros esconderijos quilometrais pelos subterrâneos e esgotos da capital. E em muitos casos, a convivência com os roedores chegava a assumir verdadeiros vínculos familiares, no sentido mais notável e literal da palavra. Exceto quando os pobres ratos deixavam de ser uma agradável companhia para virar alimento de requinte.

Afinal, velhos hábitos são qualidades que não se perdem facilmente, nem mesmo em face da calamidade. Não obstante, era fato: os ex-ricos (entre os quais uma legião de famosos) cariocas estavam comendo o pão que o diabo amassou. E graças a isso, a população de ratos seria reduzida dramaticamente, pois se tornariam um prato requintado nos subterrâneos da “cidade maravilhosa”, nova morada da orgulhosa, esbanjadora, intocável e arrogante elite carioca.

Já na União Federativa dos Pampas, ocorria uma frenética perseguição aos chamados neonazistas, com linchamentos e prisões sumários.

– Precisamos extinguir essa corja de dementes que se acham superiores aos outros. A frase proveio da boca carnuda de um jovem professor negro, entusiasmado com os ventos de mudança. E fazia certo sentido. Porém, não havia muito do que se orgulhar. Mais pavoroso que o deplorável conflito, só a assombrosa, repugnante e repudiável quantidade de mortos. Era algo tão horripilante que tornava difícil descrever até mesmo para os mais renomados jornalistas, cronistas, historiadores, sociólogos etc. Mas no fim das contas já era algo um tanto quanto habitual e o horror com que tudo era visto no início, àquelas alturas já não se fazia mais sentir. Não era incomum corpos serem encontrados em valetas, matagais, becos, em casas abandonadas etc. Enfim, em qualquer lugar. Volta e meia era encontrado um corpo pendurado em algum lugar. Especialmente de políticos.