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A Aventura e Desventura de Aurora
A Aventura e Desventura de Aurora

NOTA AO LEITOR: PARA SUA TOTAL COMODIDADE, ESTE TEXTO PODE SER LIDO NA ÍNTEGRA POR VOZ NEURAL SINTÉTICA, BASTA VOCÊ CLICAR NO BOTÃO LOCALIZADO AO FINAL DESTA PÁGINA! 

                  

A Aventura e Desventura de Aurora

 

Era sua primeira vez sozinha. Aurora estava curiosa e absolutamente empolgada. Ao extremo. Tudo era uma grande novidade. De repente ela se sentia mais livre que nunca, livre para se aventurar no que desejasse, naquilo que quisesse, em qualquer coisa que almejasse.
Tudo era deslumbre, os olhos de Aurora brilhavam de tanta ansiedade; seu coração pulsava num descompasso de total curiosidade.


E assim, Aurora andou e andou pela estrada.

Nem notou que aos poucos se afastava mais e mais da civilização. Entretida pelo cantarolar incessante e harmônico dos pássaros, ela se permitiu o embevecimento oriundo de sua tenra juventude. Juventude que de tão bela e inocente, em muitos aspectos, é como um caminho largo e florido que enganosamente vai se estreitando de maneira perigosa rumo a caminhos pedregosos e traiçoeiros.


Aurora enfim chegou a um lugar que de tão belo lhe fez desvanecer qualquer vestígio de noção e discernimento dos perigos que se ocultam sob a inocência e esplendor das flores. O lugar era sobremaneira paradisíaco, um verdadeiro sonho de uma natureza ora exaurida,
e por isso mesmo até certo ponto moribunda. Mas aquele parque era uma prova de que a natureza resistia às investidas predatórias e extremamente exploratórias do homem
em sua insaciável sede e fome por recursos da terra impotente e ameaçada.


Aurora estava encantada com tudo aquilo. O lugar era lindo. Um verdadeiro paraíso na terra.
Ela passou a mão nas folhagens exuberantes e aspirou o ar puro que invadiu seus pulmões.
Por um longo tempo Aurora vagou por aquele paraíso. Mas eis que de repente o verde foi dando espaço para um terreno inóspito que gradualmente foi tornando-se ermo. Aurora ficou intrigada, mas não se intimidou.


Adentrando o terreno ermo, seguiu adiante. Queria saber até onde ia aquela súbita secura. Logo, notou que sentia sede, mas não deu importância e continuou avançando. Minutos depois, percebeu que o terreno começava a se tornar úmido. "Água!", pensou. E avançou. No íntimo, seu coração pediu que ela retornasse rumo à segurança da área verdejante de onde saíra; mas Aurora não estava disposta a desistir de saciar sua curiosidade antes mesmo que sua sede. Queria descobrir que segredos se escondiam naquele lugar tão contrastante.


À medida que avançava, percebeu que o terreno ia ficando mais enlameado e escorregadio. Não se intimidou e prosseguiu. Lá pras tantas deu de cara com a borda de algo que se assemelhava a um poço. Aproximou-se ignorando o terreno escorregadio e olhou para baixo. "Sinistro!", pensou enquanto se esticava para olhar o buraco negro a sua frente. Não era um poço muito profundo, era menos que sua altura. Pela claridade da água Aurora conseguia ver o fundo.

Desejosa de matar a sede, Aurora decidiu adentrar o poço e beber de suas águas cristalinas. O reflexo do sol sob a água chegava a doer no olhos. E Aurora, sem titubear, se apoiou na borda do poço e desceu. Assim que sentiu a água fria tocar seus pés, um estranho calafrio a fez gemer. Mas ela não hesitou ao poço sem receio. A água estava deliciosa.

Com as mãos em concha, Aurora começou a beber daquela água. Mas assim que matou a sede e voltou-lhe a completa lucidez, sentiu que de repente o poço se tornava mais profundo. Assustada, percebeu que o fundo do poço era uma lama densa que a puxava para baixo. Não era ilusão, Aurora estava afundando naquela lama.


Assustada, Aurora esticou as mãos rumo à borda do buraco e segurou com força. Mas seu corpo estava pesado, pois seus pés afundavam mais e mais na lama. E a situação só piorava a cada segundo que se passava. Gradualmente ela perdia mais e mais o controla da situação. O terror lhe sobreveio, um medo tão penetrante que a fez congelar.


À medida que a lama a sugava para baixo, suas mãos deslizaram da borda do poço e ela se viu desprotegida, à mercê da areia movediça. Começou a gritar loucamente por socorro, mas quem a ouviria naquele lugar? Ela não lembrava de ter visto ninguém enquanto chegava.
Gritou mais e mais forte, até ficar rouca. E então, desesperançada, começou a chorar. Chorar muito. Veio-lhe à mente sua infância, sua família. Tudo que ela sentia era saudade, saudade e mais saudade. Saudade de tudo e de todos. "Pai, cadê você? Eu preciso tanto da sua mão, pai..."

Aurora sabia que quanto menos se mexesse, mais lentamente a lama mortal a engoliria. E assim ficou quieta, a espera de um milagre. Mas quando percebeu que seu rosto se aproximava da água, o desespero e angústia do medo a impeliram a perder todas as esperanças que ainda lhe restavam.

Lá fora, o sol começava a se aproximar do horizonte rubro. Dentro em pouco sumiria por detrás dos montes, para um merecido descanso noturno.

Aurora sentia dificuldade de respirar. A lama apertava-lhe o peito, sufocando-a. Só lhe restava orar ao seu Deus, ele sim poderia salvá-la, mesmo num momento em que as esperanças pareciam tão nulas. De repente, quando as sombras da noite já começavam a cobrir o mundo e o poço já se mostrava noturno, Aurora ouviu um arquejar desesperado vindo de fora, e passos
rápidos que pareciam tentar vencer o terreno enlameado. E então um sombra pairou sobre a abertura do poço.


"Aurora! Aurora!", gritou em franco e rouco terror uma voz familiar. "Pai! Pai! Estou aqui, pai! No fundo do poço!"

Era seu pai. Como ele chegara até ali, Aurora não sabia. Milagre? Só podia ser, do contrário, que outra explicação? O fato é que ele estava ali, e isso era o que bastava. "Me estenda sua mão, filha, rápido!" Aurora estendeu a mão e o pai a segurou com força. Foi difícil puxá-la para a superfície, mas com a súbita força superior de um desesperado, ele conseguiu trazê-la a superfície. E lá, os dois, exauridos pela força desprendida, ficaram deitados sob o manto brilhante de estrelas. Respiravam profundamente, a fim de recuperar o fôlego. E finalmente, após um tempo, o pai se ergueu e estendeu a mão para Aurora. Ela segurou a mão do pai e ele a ajudou a ficar de pé. Ficaram se olhando por um tempo. As palavras não saíam, até porque o silêncio já lhes falava tudo.


Abraçaram-se sob a sintonia das lágrimas e a sinfonia dos grilos que anunciavam o anoitecer. O coaxar dos sapos, aliado ao cantarolar incessante dos grilos, soava como a mais bela melodia da natureza.

Foi um abraço forte e demorado. Por fim ele lhe disse: "Vamos para casa, querida", e seguiram de mãos dadas. E quando chegaram à e segurança e proteção além do bosque, sabiam que os perigos haviam ficado para trás. Tudo estava bem. Tudo ficaria bem. Aurora estava de volta ao seio de sua amada família.


A escuridão ficara para trás, assim como as dúvidas e os tormentos oriundos da mente febril da juventude. Aurora estava em segurança, e o passado, com suas duvidosas verdades e confusas intrigas paterno-filiais era apenas uma mancha escura que devia ficar lá. No passado.

Por: Nyll Mergello