Amor e Tragédia nas Veredas do Sertão.
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Nas caatingas do sertão pernambucano, a felicidade e a desventura mesclam-se à dor de uma linda jovem cabocla de nome Maria, que se vê repentinamente envolvida numa estranha trama a partir do momento em que é abordada por uma misteriosa cigana baiana. Daquele momento em diante, nuvens negras passam a sondar seu mundo. Apaixonada e feliz ao lado de seu grande amor, conhece o sofrimento e o pesar sob a forma de um tenebroso touro de ébano que aparece do nada em sua fazenda. Sem sequer imaginar, ela e sua família passam a estar envolvidos num antigo e tão fascinante quanto fantasmagórico antagonismo recheado de ódio e vingança, uma intriga que pode ser mortal. Gerações passadas sentiram o peso da maldição e gerações futuras não escaparão ilesas. Sangue e morte assolarão o branco da caatinga, quando o natural e o sobrenatural irão se confrontar numa batalha fatal. O bem triunfará ou sucumbirá sob o poder do mal? Descubra agora, adentrando o fabuloso enigma dos mistérios que sondam a vida e a morte no coração do sertão. Seja muito bem-vindo à odisseia… A Maldição do Barbatão Negro – Amor e Tragédia nas Veredas do Sertão.
Amor e Tragédia nas Veredas do Sertão.
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PESO | 0,235447 kg |
DIMENSÕES | 21 × 29,7 × 0,51 cm |
EDITORA | UICLAP |
Nº PÁGINAS | 82 |
TAMANHO | 21 x 29,7 cm |
CAPA | Fosco, SEM orelha |
IMPRESSÃO | Preto e Branco (Papel Offset) |
FAIXA ETÁRIA RECOMENDADA | SEM CLASSIFICAÇÃO | LIVRE |
DATA DA PIBLICAÇÃO | 14/01/2022 |
TÍTULO ORIGINAL |
A Maldição do Barbatão Negro Amor e Tragédia nas Veredas do Sertão |
AUTOR | ESCRITOR | Nyll Mergello |
O Início de Tudo
Sabe como é criança, fica tudo atiçada diante de novidades. Eu e meu primo Beto não fugíamos à regra, nem tão pouco éramos exceção. Aquela cena aguçou nossa curiosidade. Afinal, criança é criança, da infância fazem parte a imprudência e o imprevisto.
Dois vaqueiros e um lindo exemplar de touro negro. Passando lentamente pela estrada que seguia rumo ao “apertado da hora”, lugar sombrio e claustrofóbico não muito longe dali. O “apertado da hora” é uma passagem dentro da serra, lugar propício para visagens, pois em tempos antigos, era ali que as pessoas descansavam dos pesados féretros ou redes que continham os mortos a serem sepultados em solo sagrado no velho cemitério da Vila de Tacaratu.
Pois bem. Lá vinham eles. E à medida que se aproximavam, fomos nos achegando mais à margem da estrada, guiados pela curiosidade e pela excitação. A estrada era protegida por uma infinita fileira de aveloses que a ladeavam por quilômetros a fio. Aveloses, testemunhas de bons tempos, mas também de épocas difíceis, onde homens confundiam covardia com heroísmo e cangaceiros faziam a lei.
Era um lindo touro, de pequenos chifres, robusto, cor de ébano. Enorme cupim o adornava, completando sua postura altiva e arrogante. Guiando-o, dois vaqueiros relaxadamente desposturados e ligeiramente distraídos, muito à vontade. Pareciam seguros, confiantes do que faziam. Mas... Bom, os eventos futuros próximos mostrariam que confiança demais pode ser um erro.
Um vaqueiro à vanguarda tinha uma corda presa à sua cela, ligando-o qual guia dominante aos cornos do touro negro logo atrás, que usava uma máscara de couro sobre seus olhos, impedindo-lhe a visão frontal, mas permitindo a vista pelos flancos. O segundo vaqueiro, na retaguarda, também tinha uma corda presa à sua cela, ligando-o aos chifres do animal logo à sua frente. Imagino que a distância que separava vaqueiros e animal era de pelo alguns metros.
Mas o touro demonstrou certa impaciência assim que percebeu, lateralmente, meu primo e eu a observá-lo admirados do outro lado da muralha de gravetos-do-diabo – outro nome para avelós. Decerto nossa presença a assisti-lo em sua passagem sujeitado, insultava-o em sua inglória e indigna posição. Mas manteve-se passivo e aparentemente resignado.
Eu, porém, muito danado, não apenas satisfeito de contemplar o jovem gigante negro, fiz um gesto de cara feia mostrando-lhe a língua malcriada em provocação ao animal. Se ele precisava de um pretexto para exteriorizar seu descontentamento, aquele pelo jeito lhe pareceu um motivo mais que razoável para mostrar a força de seu poder bovino.
Para completar a desgraça, minha ofensa ao jovem touro ocorreu justamente no ponto em que havia a passagem de acesso livre à estrada. E foi assim que de súbito, ele reagiu abruptamente, empertigando-se para trás. O vaqueiro da vanguarda, pego desprevenido pela inesperada freada involuntária de seu cavalo, voou para trás rumo ao chão num baque seco não amortizado. Para seu azar, a parte da estrada composta de piçarra macia (que fazia aquela estrada ser uma delícia de se andar e brincar) só tinha início pouco mais à frente. Até onde me lembro, aquele ponto da queda era sólido o bastante para causar danos irreversíveis.
O touro então se ergueu lançando-se num furor relâmpago para a dianteira, e o vaqueiro da retaguarda, absorto sabe-se lá em que devaneios distantes, também voou inevitável e inexoravelmente rumo ao solo, estatelando-se num choque merecido pela imprudência e desatenção em pleno trabalho.
Apavorados e absolutamente cientes das intenções maléficas do touro de ébano, meu primo e eu nos viramos para correr em direção à casa do tio Pedro. Era um momento de desespero e de ação imediata. Naquele momento dramático, apesar de nossa pouca idade e diante da situação gerada, tínhamos noção de que a distância que nos separava da segurança da casa era uma distância quase sem fim.
Mas era preciso tentar a sorte. Então corremos em desabalada carreira, resfolegando rumo a casa do meu tio. Porém, diante daquela investida ensandecida, era só uma questão de segundos até que o touro nos alcançasse, pois ele adentrara a passagem entre os gravetos-do-diabo, como o próprio Diabo encolerizado, a nos perseguir insanamente apesar da máscara.
Eu olhei para trás, e entre aterrorizado e assombrado, percebi que naquele meio termo entre a estrada e a casa do tio Pedro, não teríamos a menor chance. De fato, a única certeza era: seríamos pegos e esmagados pelo jovem barbatão negro. Nem imagino que tipo de imprevisto sobreveio ao meu primo Beto para que ele tombasse ao chão justo naquele momento de fuga. Só sei que ele tombou. Talvez eu, que corria logo atrás dele, tenha tropeçado em um de seus calcanhares provocando a queda de ambos, ou pode ter sido um mero acidente, vai saber. O certo é que nossa fuga foi interrompida quando Beto se estatelou de peito no chão e eu caí de costas sobre ele, provavelmente por estar olhando para nosso veloz e enlouquecido perseguidor.
Eu nunca esqueceria aquela cena. Eu, de costas sobre meu primo. Ambos, sob o imponente touro negro. Eu mais que Beto, pois estava sobre ele e sob o touro. Eu, em primeiro plano, era o alvo. Ele agitava impaciente a cabeça, fungando furioso. Meu olhar apavorado contemplava-o contra o céu límpido, o que dava à cena uma atmosfera surreal e até sobrenatural.
De repente, ele ergueu o corpanzil rumo aos ares, concentrando o peso sobre as patas traseiras. E em seguida, desceu a pata direita sobre o meu corpo. Mas era como se realmente só quisesse me dar um susto animal, inesquecível. Como se racionalmente não tivesse qualquer intenção de me machucar. Sei lá. Por outro lado, pode também ter sido a intervenção urgente dos vaqueiros, que já recuperados do baque, o puxavam pelas cordas numa frenética luta para dominá-lo.
Mas que ele me atingiu com um belo golpe, ah, disso eu não tenho a menor dúvida. De qualquer maneira, sou conduzido ao raciocínio de que chorei mais pelo medo do fato em si do que pelo impacto propriamente dito, pois se ele quisesse realmente me esmagar, teria feito. Tenho que aceitar: ele sabia o que fazia e não tinha intenção de me machucar. A ideia era só dar um susto num moleque malcriado. Só pode ser isso, do contrário eu não teria saído inteiro dali.
Bom, dificuldades à parte, os dois vaqueiros conseguiram a muito custo arrastar o touro até a estrada, de onde prosseguiram sua jornada. Estou certo de que o dolorido tombo de ambos foi útil para lhes ensinar a ficar atentos.
No ínterim, não bastasse o ocorrido, o tio Pedro por pouco não me deu uma boa surra, culpando-me por tudo, já que eu era notoriamente um verdadeiro pestinha. Mas lá no fundo a verdade mesmo é que há muito o tio Pedro – que era o irmão caçula de minha mãe –, estava engasgado comigo, e não escondia a vontade que sentia de arrancar-me o couro com umas boas chilapadas. E não era sem motivos, pois eu vivia a provocá-lo, chamando-o de... tio peido.
Nem é preciso dizer que após esses xingamentos, era aquele pega pra capar, eu a milhão na frente, os cabelos longos esvoaçando ao vento, e meu tio atrás, bravo como um leão. Mas embora isso fosse corriqueiro, digo de boca cheia que até onde minha mente alcança, o tio Pedro nunca conseguiu me pegar em nossas corridas.
Bons tempos aqueles.
Certamente aprendi aquele apelido do tio Pedro com algum dos meus irmãos ou primos mais velhos. Aprontaram tanto comigo quando criança. Me infligiram tantos traumas... Especialmente meus irmãos mais velhos. (mas são fatos que não entram nesta história) Mas independentemente de quem tenha tido o mérito de ser o primeiro a chamar o irmão de minha mãe de tio peido, o fato é que o pobre tio Pedro era uma vítima corriqueira desse infame epíteto. Obviamente os outros faziam isso pelas costas, ao contrário de mim.
Roupas sujas a parte, nunca vou realmente entender as intenções do touro negro. Mas o certo mesmo é que por muitos e muitos anos, eu carreguei no lado direito do abdômen, a marca de uma pata bovina, a qual começou a desaparecer gradualmente em meados da segunda metade da década de 90, mais de vinte anos após o acontecimento marcante e traumático.
É incrível que exatamente nessa mesma época, começaram a desaparecer também os sonhos insistentes que sempre haviam povoado minhas noites, desde criança. Sonhos em que predominava a figura assustadora de um tenebroso touro negro. Sonhos tão reais, que muitas vezes eu tinha a sensação de que o enorme malvado encontrava-se de fato lá fora de minha casa, a perambular pelo corredor, num vai e vem vingativo e desesperador, fungando e escavando furioso, ansioso de me esmagar. E isso, já em plena segunda metade dos anos noventa, na Vila Seabra, Zona Leste da cidade de São Paulo, época em que tais sonhos atingiram seu ápice, antes de finalmente começar a desaparecer juntamente com a marca da pata no lado esquerdo de meu abdômen.
É notável como o que outrora me causava terror nas lembranças, hoje me fascina e alimenta as recordações de infância, uma infância maravilhosa, porém muito mais completa exatamente pelo adicionamento desse ingrediente extraordinário e essencial: a reminiscente inclusão da nostálgica lembrança do gigante de ébano, O BARBATÃO NEGRO.
Por tudo isso e muito mais, só tenho a agradecer a Deus, pois minhas lembranças são mais que meras recordações de uma vida: são dádivas de uma infância feliz e completa em sua expressão mais genuína, no sentido mais pleno e abrangente da palavra FELICIDADE.
Coragem
Coragem é resistir bravamente quando o senso de vingança oprime e faz do macho, capacho. Vingança é coragem covarde que insufla o ego do fraco, induzindo-o rumo ao laço.
Nyll Mergello